A briga entre o Judiciário e o Executivo pela repartição do Fundo Especial de Reaparelhamento e Modenização do Poder Judiciário (Fundesp) revelou, para Goiás, a existência de recursos milionários provenientes da taxa judiciária cobrada do cidadão que usa os serviços da Justiça. Somente no ano passado, os valores arrecadados ultrapassaram os R$ 177 milhões e, em 2011, devem chegar aos R$ 200 milhões. Em contrapartida, o cidadão, que paga caro para ter sua demanda julgada, continua reclamando por receber serviço de qualidade desproporcional ao custo.

O perueiro José Wilson Lacerda, por exemplo, denuncia que aguarda há mais de cinco anos o julgamento de uma ação revisional de um contrato de financiamento de veículo na 11ª Vara Cível de Goiânia. Como a mulher tem sérios problemas de saúde, ele conta que foi forçado a fazer acordo com o banco e tenta, desde dezembro de 2010, sacar o dinheiro que ele depositou em juízo para quitação da dívida. "Falta apenas o magistrado responsável pela ação assinar a petição para que eu possa reaver o dinheiro, mas isso não aconteceu até agora mesmo eu comparecendo muitas vezes ao cartório pedindo agilidade no caso", assegura.

Além da morosidade, José Wilson reclama da quantia gasta para ver seu caso analisado pela Justiça. "Até agora já gastei mais R$ 1 mil com custas judiciais e outras despesas processuais", afirma, dizendo que essa valor faz falta no orçamento doméstico, que está minguado em virtude da doença da mulher, que teve de deixar o trabalho para receber, recentemente, um rim doado por ele.

A reclamação de José Wilson contra as custas judiciais reforça as críticas que têm sido feitas pela seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade afirma que os valores cobrados no Estado estão entre os dez mais caros do País. Goiás tem custas menores apenas que Mato Grosso, Rio de Janeiro, Amazonas, Tocantins, Bahia, Maranhão, Piauí e Paraíba ( veja quadro ).

A taxa judiciária é cobrada tendo como base o valor da causa proposta no Judiciário. E o Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) dispõe atualmente de uma tabela que fixa o valor mínimo cobrado hoje em R$ 41,59 e o máximo em R$ 60 mil. Apesar disso, o advogado tributarista Rafael Lara Martins garante ter sido surpreendido recentemente ao receber uma guia de custas no valor de R$ 80 mil.

Instituída pela Lei Estadual 14.376/2002, a taxa judiciária já chegou a ser contestada, no Supremo Tribunal Federal (STF), pelo Conselho Federal da OAB. Em 2006, porém, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 3826 foi julgada improcedente.

Conforme o juiz auxiliar da presidência do TJ-GO, Márcio Molinari, a maioria dos ministros do STF entendeu que a lei goiana respeita a jurisprudência da corte, que permite que o cálculo das custas judiciais pode mesmo ser feito com base no valor da causa. "Ela pode ser legal, mas continua sendo exorbitante, impedindo, muitas vezes, que as pessoas busquem resguardar seus direitos na Justiça porque não têm como arcar com despesas tão altas", pondera o secretário-geral da seccional goiana da OAB, Flávio Boanaduci Borges.

A taxa judiciária está prevista no Código Tributário do Estado. Ela é atualizada anualmente pela Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz). O último reajuste em fevereiro, elevou o tributo em 11,30%, tendo como base o Índice Geral de Preços (IGP-DI), da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Com o aumento o goiano gasta ainda mais para entrar com ação na Justiça. Em um divórcio litigioso, por exemplo em que um casal tenha de dividir um patrimônio de R$ 150 mil, o gasto com as custas iniciais, que incluem despesas com protocolo, cartório distribuidor, taxa judiciária, contador, mandados e demais repasses incidentes, totaliza R$ 1.425,71. Caso esse mesmo casal morasse no Distrito Federal, que tem uma das menores taxas registradas no País, teria de arcar apenas com R$ 83 reais.

Em outra simulação feita pela OAB, em um ação de execução no valor de R$ 1 milhão, em Goiás o interessado gasta R$ 18.443,18 com as custas iniciais. No Distrito Federal, o valor cobrado seria de R$ 450,05, subindo para R$ 1.351,85 no Mato Grosso do Sul, R$ 2,8 mil no Tocantins e R$ 3.848,00 na Bahia.

Assistência Judiciária
Para fugir das custas judiciais, a solução encontrada pode ser propor a ação em uma das varas da Assistência Judiciária. Mas, para isso, ele tem de provar que não pode arcar com o gasto, por meio de declaração financeira.

E, para os que recorrem à Assistência Judiciária as notícias também não são nada boas. Isso porque todas as ações são distribuídas apenas a quatro varas de Família Sucessão e Cível da capital. Ao contrário dos colegas de outras varas, que tem sob sua responsabilidade uma média de 3 mil ações, os magistrados dessas unidades judiciárias cuidam, cada um, de 14 mil processos, o que faz com que as ações gastem o dobro do tempo que levariam para ter um desfecho final caso tramitassem nas demais varas.

A competência para julgamento das ações propostas pela Assistência Judiciária é da Lei Estadual 13.644/200, que alterou o Código de Organização Judiciária de Goiás, restringindo a distribuição. O juiz Antônio Cezar Menezes considera que o modelo é discriminatório. A alegação é que legislação viola os direitos fundamentais de igualdade, do amplo acesso à Justiça e da razoável duração do processo, previstos no artigo 5º, da Constituição Federal.

O mesmo entendimento tem o subprocurador para Assuntos Jurídicos do MP, Abrão Amsy Neto. "Ela causa prejuízos ao cidadão, que passa a ter de esperar muito mais tempo para ter seu caso apreciado", diz.

fonte : o popular
folha 10:28