Depois de seis meses de investigações, onze integrantes do segmento de produção e distribuição de álcool hidratado em Goiás foram denunciados ontem pelo Ministério Público (MP) estadual por crimes contra a ordem econômica e formação de quadrilha. Na denúncia, formalizada pelo promotor de Justiça Murilo de Morais Miranda, o grupo é acusado de promover aumentos abusivos e cartelização regional de preços no período de entressafra.

O MP também revelou os nomes dos acusados, uma vez que a Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Consumidor (Decon), responsável pelo inquérito que originou a denúncia, não divulgou sob a alegação de direito ao sigilo. A ação será remetida à 10ª Vara Criminal, sob responsabilidade da juíza Placidina Pires, que vai decidir se acata ou não a denúncia.

As informações, levantadas pela Superintendência de Proteção aos Direitos do Consumidor (Procon-GO) e pela Decon, que fazem parte dos autos do processo, também serão encaminhadas para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Entre janeiro e abril, o consumidor goiano viu o preço do litro de álcool saltar de R$1,69 para R$ 2,49 e da gasolina subir de R$ 2,59 para R$ 3,49 nas bombas dos postos de combustíveis da capital. Foram investigados proprietários de usinas, de distribuidoras e de postos de combustível, além de representantes do sindicato da categoria.

Escutas telefônicas

Para fundamentar a denúncia, o MP utilizou os inquéritos administrativo - feito pelo Procon - e o policial, realizado pela Decon. Escutas telefônicas também foram usadas como método de coleta de provas. Entre os celulares grampeados estava o do presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo de Goiás (Sindiposto), Leandro Lisboa Novato.

De acordo com o documento divulgado pelo MP, ele conversa no final de março com o vice-presidente do sindicato, Márcio Martins de Castro Andrade, para autorizar aumento no preço do etanol em dez centavos.

Em outro momento, Leandro Lisboa fala com Marcos Antônio Ribeiro Borges, funcionário do Sindiposto. Os dois trocam informações de que a Shell irá subir o preço do combustível e que na semana seguinte o preço chegará R$2,25. Ainda foram divulgadas transcrições de conversas de José Divino Gualberto de Oliveira, consultor do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubricantes em Goiás (Sindicon).

Num dos trechos revelados, ele afirma à uma pessoa denominada de Doutor Mauro que não mexe com os preços "sem consultar vocês". Num outro diálogo, ele diz que em "Goiás tem uma ação criminal do Procon e outra da Decon" e por isso todos devem tomar cuidado com os telefones, pois eles estão grampeados ( veja quadro ).

Em 15 de junho deste ano, ao concluírem o inquérito, os delegados Carlos Fernandes de Araújo e André Abrão, da Decon, não divulgaram os nomes dos indiciados alegando pedido de sigilo expedido pela Justiça devido às informações empresariais e industriais contidas no inquérito. A situação agora é diferente. Todos os jornalistas presentes à entrevista coletiva convocada pelo MP tiveram acesso a uma cópia da denúncia protocolada na manhã de ontem no Judiciário.

Preço tabelado

Em sua argumentação, o promotor Murilo Miranda explica que no primeiro semestre deste ano, os denunciados formaram uma aliança para fixar preços de combustíveis para ofertar aos distribuidores e ao mercado consumidor, além de alinhamento de preços, visando o controle regionalizado do mercado por um grupo de empresas.

A comprovação se deu por meio de pesquisas de notas fiscais realizadas pelo Procon-GO e escutas telefônicas autorizadas judicialmente. Entre 27 de dezembro de 2010 e 26 de março de 2011, a elevação de preços do álcool vendido pelas usinas citadas oscilou entre 32,06% e 43,94%.

Numa reação em cadeia, as distribuidoras também promoveram aumentos, mas de forma antecipada e a um valor bem superior para a rede de postos Treze e Interprise. Pesquisa de preços realizada pelo Procon-GO entre os dias 28 e 30 de março em 228 postos de combustíveis da região metropolitana da capital mostrou que em 47,14% praticavam o mesmo preço de gasolina, R$ 2,89.

O mesmo ocorria em relação ao etanol. As investigações mostraram que o estoque de álcool hidratado, de sete bilhões de litros, é suficiente para abastecer o mercado brasileiro durante a entressafra de 2011/2012, o que não justificaria o aumento no preço do combustível.

"Ficou comprovado que em determinados momentos as usinas ganharam muito, manipularam preços na produção, depois as distribuidoras também manipularam preços e os postos ganharam com anuência do Sindiposto", explicou o promotor Murilo de Morais.

Sindiposto nega combinação de preços
Presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo no Estado de Goiás (Sindiposto) e um dos denunciados, Leandro Lisboa Novato, disse ao POPULAR que está tranquilo. "Nunca houve combinação de preços. Goiânia tem mais de 240 postos, como apenas três pessoas combinariam preços?", perguntou.

Segundo ele, o problema do aumento do etanol ocorreu em todo o Brasil, não apenas em Goiânia, mas pela pressão da opinião pública, ele sabia que a denúncia ocorreria.

Por meio da assessoria de comunicação, Marcelo Ribeiro de Mendonça, sócio-proprietário da Usina Energética Morrinhos S/A, considerou a denúncia "descabida e sem zelo".

Conforme a assessoria, o acusado sequer foi ouvido ou citado no inquérito e nenhum membro da empresa teve o sigilo telefônico quebrado. Afirmou ainda que durante a investigação foi apontado o nome da pessoa responsável pela definição do preço praticado no mercado, uma vez que a gestão é profissionalizada.

A assessoria de Marcelo Ribeiro de Mendonça disse ainda que este foi o primeiro ano que a indústria vendeu combustível em Goiás e, por esse motivo, praticou preço menor que a concorrência. "O Ministério Público não tem um parâmetro para verificar se a empresa teve mais ou menos lucro", defendeu a assessoria.

Espera

Por meio da sua assessoria de comunicação, o empresário Rubens Ometto Silveira Mello disse que "ainda não teve nenhuma confirmação oficial de denúncia e que, no momento oportuno, irá se manifestar oficialmente".

A outra usina filiada ao Sindicato da Indústria de Fabricação de Álcool do Estado de Goiás (Sifaeg), a Cosa Centro-Oeste S/A, localizada no município de Jataí, preferiu não comentar a denúncia.
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fonte: o popular